"Using stories of many women and research data, The Last Taboo counters the motherhood ‘requirement’ and the glorification of motherhood everywhere in the culture, exposing the harm motherhood often inflicta on women (their relationships, careers, self-identify, financies energy), unwanted children (half of all pregnancies are unplanned), the human species and environment (both threatened by overpopulation). For too long, women have been consignes to a life not suited to all, or even most, women in the modern era, an era reeling under the environmental and human devastation of overpopulation." (http://rosemaryagonito.com)
As questões de género, e especificamente as questões que se relacionam com a maternidade, são sempre para mim questões pessoais que recuso sempre discutir de ânimo leve. Seja porque sou mãe e porque já me vi envolvida, inúmeras vezes (umas mais subtis do que outras), em casos de discriminação devido a esse facto, seja porque cresci numa sociedade que ainda apresenta resquícios de idolatria da máxima "Deus, Pátria e Família" e da divisão clara e inequívoca dos papéis para ambos os géneros: o homem providencia o sustento da casa e a mulher cuida da casa e dos filhos (ainda que a mulher trabalhe, continua a ser atribuída a ela a responsabilidade dos filhos e da casa), o assunto é-me caro.
Apesar de tudo isto, eu confesso que tenho dificuldade em entender o discurso supostamente feminista que, tentando argumentar contra um sistema patriarcal que reduz a mulher à condição de animal procriador, cai sempre no extremo oposto, argumentando que todos os problemas das mulheres advêm do facto de terem de ser elas a suportar o peso da maternidade. Não consigo encontrar um só argumento que me convença disto, por mais que tente (vd. http://omnispersuasiocarcerest.blogspot.com.es/2009/11/das-questoes-de-genero.html).
Há tempos, numa aula de literatura, num curso de actualização em ensino de Português Língua Estrangeira, a propósito de feminismo e emancipação das mulheres nas décadas de 60-70, surgiu o tema da maternidade e do casamento. No decorrer da exposição das várias posições, houve uma formanda que partilhou a sua história pessoal dizendo que, a certa altura da sua vida, decidiu suspender o emprego seguro que tinha para poder acompanhar, com os seus filhos, o seu marido nas suas constantes estadias de trabalho no estrangeiro. Não só foi questionada, ali mesmo, a sua opção, como se sentiu como que uma discriminação negativa relativamente à própria maternidade.
Abro aqui um parêntesis para sublinhar que a discriminação da maternidade em ambiente académico é recorrente, mas continua a ser tema tabu. Perguntem a qualquer mulher que tenha ficado grávida enquanto fazia a sua licenciatura, mestrado ou doutoramento, ou qualquer prova de acesso a empregos ou cargos de maior responsabilidade, o que sentiram por parte de colegas, professores, chefes, juízes, contratadores, etc., quando estes tomaram conhecimento da gravidez. Do olhar de pena e das palavras de consolação, passando pelo olhar de desprezo e de imposição de culpa, do tipo "Tinhas de fazer isso agora?", ou "Acabou-se a tua vida académica/profissional!" até à contundente perda do cargo, da tese ou do orientador, os casos repetem-se. A minha teoria é que cada mulher grávida tem pelo menos um caso de discriminação para contar.
Um dia antes do curso de que falava acima, cá fora, na hora do almoço, num mesa onde apenas estavam mulheres, alguém comentava, a propósito da recordação do seu tempo de faculdade, o caso de uma professora da faculdade que supostamente teria conseguido o lugar pelo facto de ser casada com um professor já pertencente à universidade. Com a pouca coragem que a minha timidez me permite nestas ocasiões, e interrompendo a conversa, eu perguntei se alguma vez aquela afirmação seria feita em relação a um homem. Pode até acontecer, mas quais seriam as possibilidades de alguém questionar a capacidade profissional de um homem, tendo por base o mesmo argumento? Ali estavam cinco mulheres maduras, quase todas com filhos, quase todas casadas, a contribuir para perpetuar o mesmo tipo de discurso que censuramos à sociedade.
Mais tarde, naquela mesma aula de literatura, eu, ao perguntar-me se, ao ser atribuída unicamente à mulher a responsabilidade de criar as crianças, não seriam elas mesmas também as únicas responsáveis pela educação machista contra a qual elas próprias se rebelam? E, mais uma vez, tive de render-me às evidências: tinha caído na mesma armadilha, aquele era o meu preconceito.
As leituras racionais feministas e as experiências de vida, muitas traumáticas, parecem não nos ter ensinado nada. O que uma outra jovem mulher, solteira e sem filhos, disse, naquela mesma aula de literatura, resume bem o que se passa e que contradiz, no caso da mulher, uma frase bem conhecida de todos: não importa o que fazes, quer penses que podes, quer penses que não podes, quer penses que estás certa ou quer penses que estás errada, a verdade é que se és mulher, estarás sempre, sempre, e sublinho novamente sempre, errada. Este é o ponto principal que deve ser discutido.
Porque o problema não está na maternidade em si, mas nas condições que a sociedade proporciona para que cada mulher possa fazer a sua escolha em liberdade. Estas condições vão desde a educação de género e sexual desde a mais tenra idade, à divulgação e disponibilização de métodos contraceptivos, até à legislação relativa ao apoio à parentalidade. Desenvolver na sociedade a sensibilidade para o facto de que a gravidez e a educação é um assunto que diz respeito a todos e que não nos podemos arvorar de sermos uma sociedade livre enquanto tivermos mulheres que não possam escolher em consciência e livremente ser mães, quando temos mães que lamentem a maternidade.
E enquanto vivemos no melhor dos mundos possíveis, deixo um apelo ou um mini-manual de boas maneiras para os mais distraídos e distraídas: quando vires uma mulher grávida, a única palavra que deve sair da tua boca é "Parabéns!" ou "Felicidades!". Não importa em que fase da vida ou em que altura profissional ou académica se encontra a mulher. Qualquer outra coisa parecida com pena, condescendência ou desprezo, como em qualquer situação, é reprovável e só te prejudica a ti enquanto ser humano digno desse estatuto. Se sentirem intimidade com os pais grávidos, podem sempre dizer, se for mesmo sincero: "Estou aqui para ajudar se for necessário.".
E se sentirem simplesmente total aversão pelo assunto do cuidar, bebés, pais, mães, etc., então deixem o assunto para quem sabe e para quem se importa e... calem-se e fujam. A sério, ponham-se a milhas. Ninguém é obrigado a conviver com deficientes emocionais! É tudo.
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