Houve um certo dia, alguns anos atrás, em que eu decidi prescindir da Literatura em favor da Linguística porque me parecia esta mais perto das pessoas e aquela, de certa forma, elitista e afastada do presente e do real. Decidi isto em pleno coração de África, em Makamba (uma pequena aldeia rural no interior do Burundi), quando alguém, que pela sua nacionalidade e conhecimento histórico deveria compreender bem o conceito de alteridade e diversidade, se riu de mim por eu querer aprender kirundi e não swahili, ou outra língua mais franca e de maior peso ou expressão. Não respondi, como nunca respondo, com medo de me precipitar ou ferir susceptibilidades (que isto das relações pessoais é assunto muito delicado, e eu prefiro sempre manter o diálogo aberto em vez de ter a razão) e fui para casa a pensar.
Naquela altura - e também é assim hoje -, pareceu-me que a experiência de iniciar um contacto, ainda que com um vocabulário limitado e com regras aprendidas de forma rudimentar, com alguém desconhecido na sua língua materna é um acontecimento absolutamente extraordinário. Estamos a dizer: "Eu estou a tentar ser teu amigo e este meu desejo de te tocar, de chegar a ti é tão maior e imenso que, não importa as dificuldades que eu tenha de ultrapassar, não vou desistir. Quero conhecer-te no teu mundo". É isto, eu acho, que dizemos quando fazemos um esforço por falar uma língua minoritária. Estamos a dizer que renunciamos ao artificial e forasteiro uso de uma língua franca ou interlíngua, por maiores que sejam as dificuldades, para chegar ao outro, para conhecê-lo na dimensão do seu próprio espaço, no à-vontade e familiaridade da sua língua materna, seja ela qual for. "Gosto tanto de ti que ultrapasso todas as barreiras para poder estar mais perto".
É isto penso que quero dizer quando conheço alguém, principalmente num lugar estranho ao meu.
Por que razão, estando nós cada vez mais perto do outro, nos sentimos e o sentimos cada vez mais longe?
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